sexta-feira, 22 de fevereiro de 2008

a literatura vai ao cinema- I

o evento é da indústria cinematográfica -- não da arte cinematográfica. o Oscar norte-americano é feito para servir os grandes, gigantescos ,interesses do cinema; festivais de arte, essencialmente(mas não exclusivamente : já existem, há muito, distorções neles) são Berlim, Veneza, Cannes (sic) , Sundance. de qualquer modo, a premiação do Oscar está às portas e a ocasião é boa para refletir sobre as relações entre o cinema e a literatura.
O cinema vai à literatura
(e a literatura se vale do cinema)
Cinema e Literatura, criações do imaginário, parceiros na construção da cultura, na era do domínio da imagem visual dividem ainda o desejo comum: fornecer o alimento indispensável à sobrevivência da fantasia, da inteligência, da crítica. E prazer.” (Beatriz Resende _UFRJ)
Poucas formas artísticas estabelecem entre si tantas relações de sentido mútuo, ainda que sujeitas a entreveros e embates, acusações de “infidelidade autoral”, polêmicas sobre liberdades de criação, tantos laços e gaps entre a tela e a página__ até porque são diferenciadas as linguagens e distintos os respectivos códigos e modos de funcionamento : narrativa literária e narrativa fílmica distinguem-se e na maioria dos casos contrastam- se; são sempre difíceis as transposições de uma para o outro, pois as características intrínsecas do texto literário __ originalidades, subjetividades, entrelinhas, elaboramentos __ por princípio não encontram a mesma expressão na narrativa cinematográfica.
A par das diferenças, porém,entre a página e a tela há laços estreitos__ em forma de ‘mão e contra-mão’ : a página contém palavras que acionarão os sentidos e se transformam na mente do leitor em imagens; a tela abriga imagens em movimento que serão decodificadas pelo expectador por meio de palavras.Entre a literatura e o cinema, há um parentesco originário, diálogo que se acentuou sobremaneira após a intermediação dos processos tecnológicos. Assim, a enorme e expressiva influência da literatura sobre o cinema tem sua contrapartida, por meio de um ‘cinema interior ou mental’ sobre a literatura e as artes em geral, mesmo em uma época precedente ao advento dos artefatos técnicos.
Optando pela modalidade narrativa, o cinema roubou da literatura parte significativa da tarefa de contar histórias, tornando-se, de início, um fiel substituto do folhetim romântico. E, apesar de experimentações mais ousadas, como a "avant-garde" francesa da década de 1920, ou o surrealismo cinematográfico, que buscaram fugir dessa linha, a narratividade continua a ser o traço hegemônico da cinematografia.
Daí, adaptar para o cinema ou para a televisão — meios reconhecidamente ligados à cultura de massa — obras de autores como Shakeaspeare, Dostoiévski, Tolstói, Balzac, Flaubert, Machado de Assis, Graciliano Ramos, Guimarães Rosa, para citar apenas alguns nomes de relevo no panorama universal e nacional — equivale a trazer para os mídias o prestígio da grande arte ou, no dizer de alguns, tornar a arte erudita acessível ao grande público. Mas a adaptação de obras literárias para o cinema e, posteriormente para a televisão — meios que privilegiam a linha narrativa — também não se tem feito sem conflitos, pois as adaptações resultam sempre em empreendimentos insatisfatórios.
Não se pode negar que , principalmente em seu período clássico, o cinema tenha procurado na aproximação com a literatura uma forma de legitimar-se. E além das freqüentes adaptações de obras literárias para a tela, tornou-se prática corrente, em particular naquele período, a contratação de escritores como roteiristas. Assim é que, em Hollywood, notáveis escritores como F. Scott Fritzgerald, Aldous Huxley, Gore Vidal, William Faulkner, James Age e Nathanael West, dentre outros, tornaram-se os contadores de muitas histórias que comoveram o grande público e garantiram o sucesso de vários empreendimentos. Saber se tais roteiros traziam a marca da criação literária já é uma outra questão, que talvez possa ser analisada a partir da postura de alguns desses escritores-roteiristas. Faulkner, por exemplo, não fazia segredo sobre a natureza de sua atividade em Hollywood: "Faço apenas o que me dizem para fazer; é um emprego, e pronto."

(continua).....

Um comentário:

mauro rosso disse...

aguardo com expectativa a continuação deste excelente artigo.

sugiro que esse blog de Mauro Rosso seja difundido pelo universo www-- o que me parece não estar ocorrendo. alô,alô, Google, providenciar !