terça-feira, 4 de agosto de 2009

os muitos Euclides da Cunha,pensador do Brasil


Estamos no que se estabeleceu ser “o ano Euclides da Cunha”, pelo fato de registrar o centenário de sua morte, a 15 de agosto de 1909 – mas a exemplo do que deve ser da mesma forma oficializado para os grandes nomes da literatura brasileira ‘todo ano é ano de Euclides da Cunha’. No mínimo, como justa reverência a um dos maiores intelectuais do País, um excepcional pensador a merecer olhar ,estudo e difusão mais acurados e mais abrangentes, porquanto poucos como ele,em seu tempo, dedicaram-se tanto à reflexão e interpretação do Brasil ,inclusive sob diversas lentes – da literária à política ,da artística à sociológica – em algumas delas manifestando-se um verdadeiro pioneiro,anunciador,prenunciador e antecipador de muitas questões hoje existentes e debatidas.


Euclides da Cunha : político,ecopolítico,etnopolítico

Euclides da Cunha -- não um, mas muitos e múltiplos Euclides da Cunha : matemático,politécnico,engenheiro, geólogo e geógrafo autodidata e prático; positivista,cientificista,evolucionista - socialista ; jornalista,articulista,ensaísta, escritor, poeta – sobretudo pensador e intelectual; na obra, a literatura,a ciência,a história,a filosofia, e ainda a geografia,a geologia,a botânica, a engenharia, a técnica ; propugnador do primado da ciência e das “elites dotadas”- mas empenhado nas questões sociais; ardoroso republicano, desapontado,desiludido, cáustico crítico depois; Euclides dos primeiros tempos,Euclides de Canudos,Euclides de São José do Rio Pardo\Vale do Paraíba,Euclides da Amazônia; Euclides político,Euclides ecopolítico,Euclides etnopolítico,Euclides geopolítico.Acima de tudo, um brasileiro de primeiríssima linha na história cultural, política, social – até mesmo ideológica -- do País.
Construiu uma obra eclética em conteúdo, temática e variedade genética, e brilhante em forma,estilo e escrita , aliando a excelência de sua linguagem ,seu vocabulário apurado, sua sintaxe precisa ,à ‘riqueza’ da observação,compreensão e perfeita interpretação dos elementos sociais e da condição humana do brasileiro,seus dramas e vicissitudes,aspirações e necessidades : a par das questões políticas, a questão social inscreve-se no pensamento euclidiano como um dos componentes, ou constituintes, mais intensos e atuantes.
Uma ‘existência múltipla’,digamos assim, que tem política e filosoficamente suas origem e base no binômio positivismo (então ideologia prevalente sobretudo nas camadas sociais mais elevadas e entre a intelectualidade) -cientificismo (emprestado do ‘darwinismo social’, buscando encontrar leis de organização da sociedade brasileira )– cultuado a partir da Escola Militar e praticado na sua crença devota na República -- e detém seus corolário e conclusão no socialismo – sob um processo de geração de outros níveis de consciência -- ecopolítica e etnopolítica - a partir de Canudos e em seguida de São José do Rio Pardo\Vale do Paraíba e da Amazônia , três basilares vetores, ou vivências, de inflexão em sua vida intelectual e profissional. Na trajetória, um primeiro Euclides ardoroso,doutrinário, propagandista, devotado à República e crente no futuro; depois, desiludido, desalentado, cético com o regime e os políticos ; em seguida, estarrecido com o que testemunhara em Canudos e profundamente reflexivo e revisionista ; por fim, ao mesmo tempo extasiado e preocupado com a Amazônia, “um paraíso perdido”, “deslumbrante palco onde mais cedo ou mais tarde se há de concentrar a civilização do globo”. Em todos eles um Euclides lúcido,consciente, empenhado em formular rumos e destinos para o País, um Euclides pioneiro e precursor no trato de questões absolutamente atuais.
a política em Euclides
A política desde cedo exerceu irresistível atração em Euclides , sua biografia e sua bibliografia se confundem com a própria história social e política brasileira do final do século XIX e início do século XX. Como ser político, preocupava-se e envolvia-se com tudo – não apenas a ordem institucional, o regime político, mas com o homem brasileiro, o habitante do litoral ,do interior,do sertão e da Amazônia, com o povo , com a história e geografia brasileiras e sul-americanas, com o Brasil como nação, com a nacionalidade (cuja definição exata constituía, a seu ver, “nossa missão”).Euclides tratou de política sob as mais variadas formas e expressões ,entre artigos publicados originalmente em jornais ( A Província de S. Paulo - origem de O Estado de S. Paulo,onde publicou a maioria de seus artigos - Democracia, O Paiz, Jornal do Commercio,Revista Brasileira, O Rio Pardo,Kosmos,Revista Americana), textos e ensaios integrados às coletâneas Contrastes e confrontos(1907), À margem da história(1909), Peru vs. Bolívia(1907) e até na poesia – haja vista os poemas dedicados a Danton,Marat,Robespierre e Saint-Just, líderes jacobinos da Revolução Francesa -- bem como em conferências , como “Castro Alves e seu tempo”(1907), em cartas a amigos e correligionários, nas marcantes correspondências com o sogro Sólon Ribeiro, e especificamente quando de sua vivência (1898-1901) em São José do Rio Pardo , no programa do jornal O Proletário(1899) e o manifesto trabalhista de 1º. de maio de 1899 .
O propagandismo republicano que engendrou e praticou --pelo menos até a metade da década de 1890 - era para Euclides antes e acima de tudo propagandismo científico, irrevogavelmente convicto da superioridade da ciência sobre todas as demais formas do saber. Propugnava pelos ideais de uma sociedade humanitária, justa,democrática, moderna e civilizada – seu projeto de “Pátria humana”,como resultado possível e desejável do progresso material e científico engendrado no século XIX, a intensificar-se no século XX -- conjugando o industrialismo com a edificação de uma sociedade progressista e justa , convictamente entusiasta do “curso irresistível do movimento industrial”,para ele a lídima consumação do liberalismo econômico,indissoluvelmente acoplado ao liberalismo social que sustentava com tanta ênfase.
Havia em Euclides essencialmente uma espécie de romantismo libertário, combustível de sua crença política na República—acima mesmo de interesses pessoais --ou no republicanismo , como o único meio de o Brasil vir a ser uma Nação desenvolvida e moderna e o único modelo de organização política e social verdadeiramente democrático por eliminar privilégios e permitir ascensões e inclusões sociais .A posterior desilusão com a República foi muito mais e antes de tudo o desalento com o fracasso do ideário de liberalismo social e a certeza da não-consecução do projeto político-ideológico-científico. Talvez na sensibilização anos depois, com as teses socialistas visse nelas o suporte ideológico -- não propriamente o socialismo per se -- que propiciasse a realização daquele ideário humanitário e de justiça social. .
Passou da militância pela República à descrença com os rumos do novo regime , o distanciamento gradativamente se revelando na seqüência de artigos -- nos quais criticava de forma aguda quer o militarismo dos primeiros governos, quer o liberalismo artificial de uma Constituição que as elites civis violentavam por meio de fraudes e manipulações eleitorais : o Estado, ‘tomado’ e manipulado ostensivamente pelas oligarquias políticas e econômicas, o arrivismo financeiro desenfreado pelos especuladores, o empresariado e cafeicultores valendo-se acintosamente dos recursos públicos, deputados e senadores valendo-se da distribuição de cargos e sinecuras para familiares,amigos,protegidos e cabos eleitorais -- em diversas cartas,a primeira ao pai , em junho de 1890 -- expressando sua avaliação de que o país estava entrando em um "desmoralizado regime da especulação,em que se pensava em tudo, menos na Pátria"(muito de seu desalento vinha também do Encilhamento e sua “orgia especulativa ,e a ambição fiduciária dos sequiosos das rendas de novos cargos”) – depois ao sogro,major (à época) Sólon Ribeiro, em 1895 – dizendo que “a situação é justamente de espertos,daí o grande desânimo que me atinge.(...) Às vezes creio que a nossa Republica atravessa os piores dias” , lamentando “esse descalabro assustador, ante essa tristíssima ruinaria de ideais longamente acalentados (...), a República agora paraíso dos medíocres, nela o triunfo das mediocridades e preferência dos atributos inferiores." O que mais o inconformava era o desvirtuamento dos ideais republicanos – ao fundo e na essência, não custa reiterar, a frustração no que tange às proposições inerentes ao liberalismo social.
O idealismo republicano , diluído ao longo dos anos subseqüentes , veio a radicalizar-se na elaboração de Os sertões.Na essência, as críticas traziam implícita a revisão de algumas de suas próprias posições políticas, marcadas originariamente pela adesão a um conjunto de crenças científicas e filosóficas materializadas no movimento republicano, mas que foram paulatinamente, a par dos desmandos praticados no novo regime, se incorporando a um processo de conhecimento e consciência inerentes a sua vivência em Canudos – testemunha ocular e física dos cenários de miséria,opressão, violência, injustiça social -- e depois em São José do Rio Pardo, quando e onde entrou em contato com um movimento ideológico – de resto já grassando em partes do mundo e entre muitos intelectuais brasileiros -- então emergente na cidade.
Não pode deixar de se considerar, dentro do espectro ideológico euclidiano, a questão do socialismo, assumido explicitamente a partir de 1899 – mas convém saber que já por volta de 1894 entregara-se com fervor aos estudos brasileiros e interesse pelas ideologias renovadoras que já encontravam eco no Brasil republicano,entre políticos,intelectuais e literatos. Euclides efetivamente se achegou ao grupo socialista de São José do Rio Pardo – é certo,por exemplo,que elaborou junto com o amigo Francisco Escobar o programa de O Proletário ,órgão do “Clube Internacional Os Filhos do Trabalho”,bem como o expressivo manifesto trabalhista de 1º. de maio de 1899 -- mas não há provas efetivas e concretas de ter sido propriamente um militante ativo.Por outro lado, há de se ter em vista que mensagens ou discursos de teor socialista estão explicitamente presente nos artigos por ele publicados em 1º. de maio de 1892 e 1º. de maio de 1904 – este, intitulado “Um velho problema” -- ambos em O Estado de S. Paulo.
a ecopolítica em Euclides
De olhar voltado prioritariamente para o interior do país , Euclides da Cunha foi rigorosamente o primeiro intelectual brasileiro a cultivar e externar preocupações com o meio ambiente, inclusive fazendo da ecologia um tema político, um item de propostas de ação política, em que registra,observa e critica os embates entre uma civilização, para ele ainda improvisada, com a natureza do país , lançando as bases, inéditas no país , avançadas ao extremo em seu tempo e antecipadoras dos conceito e elementos do desenvolvimento sustentável , na permanente preocupação euclidiana no conciliar progresso com a preservação ambiental.
Ainda com 18 anos,lavrava um protesto em seu primeiro trabalho no jornal O Democrata de 4 abril 1884 –pequeno jornal dos alunos do colégio Aquino,onde estudava desde 1883, no qual inclusive foi aluno de Benjamin Constant,professor de matemática,que iria em 1886 reencontrar na Escola Militar e nele insuflar os ardores republicanos ; no artigo, externando o interesse e apreço pela natureza que estaria presente em toda sua obra,ao lado de descrever em viagem de bonde para o colégio as maravilhas do cenário natural que descortinava,as matas e florestas da cidade do Rio de Janeiro, criticava o progresso representado pela estrada de ferro que degradava a natureza : “(...)Ah ! Tachem-me muito embora de antiprogressista e anticivilizador, mas clamarei sempre e sempre: - o progresso envelhece a natureza, cada linha do trem de ferro é uma ruga e longe não vem o tempo em que ela, sem seiva, minada, morrerá! E a humanidade, não será dos céus que há de partir o grande "Basta" (botem b grande) que ponha fim a essa comédia lacrimosa(...)Tudo isto me revolta ,me revolta vendo a cidade dominar a floresta,a sarjeta dominar a flor”.
Os sertões eram vistos por Euclides com um olhar mais amplo,abrangente e profundo que o de um geógrafo puro, mais do que de um simples geólogo, muito mais que de qualquer antropólogo : desenha,disseca e ‘interpreta’ o cenário dos sertões, descrevendo com rigorosa exatidão as formação, estrutura e nuances geológicas e climáticas da região – a “terra ignota” – e a partir daí, compõe sua reflexão sobre a seca , a incapacidade geral do país em resolver o problema – de um lado, evocando exemplos bem-sucedidos de soluções corretoras dos efeitos das secas adotada por outros países (“a exploração científica da terra,coisa vulgaríssima hoje em todos os países, é uma preliminar obrigatória do nosso progresso”) ; em diversos escritos propõe soluções técnicas, dessa ordem, para a questão no Brasil : se é capaz de criar desertos, o homem poderia também extingui-los – de outro, denunciando a utilização política da seca que tem servido para “a retórica de congressos e conferências,para projetos mirabolantes,para justificar uma burocracia voraz, perfeitamente digna de salvar o Nordeste nas esquinas da Avenida [assim] O Brasil não resolve seu grande problema,que não é apenas administrativo porque é igualmente moral,social e político”.
Depois, nos textos “Fazedores de Desertos”, publicado originalmente em 1901,em O Estado de S. Paulo, e “Entre as Ruínas”, em O Paiz,1904 ( cuja primeira versão, sob o título “Viajando” , é de 1903, em O Estado de S. Paulo– ‘credita’ ao próprio avanço humano o efeito maléfico na vegetação, nos recursos hídricos, nos solos, no clima, provocado pelas queimadas numa agricultura ainda com métodos herdados do período colonial . Como na maioria de seus textos sobre o tema, Euclides confronta riquezas passadas e farturas naturais com uma realidade arruinada -- “temos sido um agente geológico nefasto e um elemento de antagonismo terrivelmente bárbaro da própria natureza que nos rodeia” – explica,algo didaticamente, o processo de agricultura itinerante que ia tornando a terra cada vez mais desabrigada e pobre,e evoca a história ao atribuir a devastação florestal,como um ciclo desde os primórdios, ao indígena brasileiro , continuada pelo colonizador,feito um “terrível fazedor de desertos”, fosse o garimpeiro, “atacando a terra nas explorações mineiras a céu aberto, esterilizando-a com o lastro das grupiaras,retalhando-a a pontaços de aluvião” ou lavrador,“eliminando, a partir do mau ensinamento aborígene [a queimada] as grandes extensões de matas e florestas e aviltando o clima”, tornados ambos herdeiros de um modelo nefasto de uso da terra, agravando-o a ponto de esterilizar sua fertilidade e tornar a paisagem uma ruína só, de natureza e de pessoas,inclusive desencadeando fenômenos climáticos e geológicos na formação de desertos e do regime das secas – as quais dissecaria como ninguém ao dedicar-se ao sertão.Euclides contestava um modelo “peculiar e oportunista” de desenvolvimento, que “povoa despovoando”, “não multiplica as energias nacionais, desloca-as”, fazendo “ avançamentos que não são um progresso, indoao acaso, nesse seguir o sulco das derribadas, deixando atrás um espantalho de civilização tacanha nas cidades decaídas circundadas de fazendas velhas”.
Ninguém antes de Euclides dedicou-se com tanta ênfase, profundidade e , em especial , pioneirismo,à Amazônia : foi o primeiro dos literatos brasileiros a conhecê-la in loco e a retratar ,dramaticamente, aquele “paraíso perdido” e despertar,em textos ‘reivindicantes, vingadores’, o conhecimento e a discussão dos gritantes problemas que afligiam(afligem) a região – segundo ele um outro Brasil,aliás um novo Brasil .Sob o escopo de seu projeto de integração nacional, a Amazônia seria o destino inevitável dos contingentes saídos de outras regiões por adversidades climáticas,geológicas,geográficas e especialmente sociais e econômicas,constituindo-se na “mais dilatada diretriz de expansão de nosso território”, e para seus olhos embevecidos o “deslumbrante palco onde mais cedo ou mais tarde se há de concentrar a civilização do globo” – daí vindo a ser um dia objeto de cobiça estrangeira, vítima do expansionismo e ambições territoriais das potências mundiais (“a expansão imperialista das grandes potências é um fato de crescimento... e a conquista dos povos é uma simples variante da conquista de mercados”), o que exigia, sustentava Euclides, imediata e eficaz ação por parte das autoridades e do Poder Público para completas defesa e integração da região.Na Amazônia, por Euclides, a ecopolítica recebe novas lentes : o olhar euclidiano sobre a região e seu ‘destino no Brasil e no mundo’ envereda e lança as primeiras luzes para a geopolítica,rigorosamente nos moldes,diga-se, dos mais atuais e importantes debates .
a etnopolítica em Euclides
A etnia brasileira foi um dos temas que mais mobilizaram Euclides para a formulação de reflexões sobre a nacionalidade, per se um tópico já excepcionalmente preponderante em seu arcabouço intelectual .No capítulo “O homem”,de Os sertões, por exemplo, expôs analiticamente as origens do homem americano, a formação social do sertanejo,e em especial os “malefícios da mestiçagem”: numa espécie de teoria étnica fatalista , admitia a história brasileira ter sido construída por meio do choque entre etnias e culturas condenadas ao desaparecimento -- rigorosamente de acordo, diga-se, com as teorias do sociólogo austríaco Ludwig Gumplowicz ( que,sabemos, foi um dos pilares filosóficos ,ao lado de Spencer, do pensamento evolucionista de Euclides) e sua teoria de a História guiada pelo conflito entre raças a resultar,conforme as ‘leis’ do evolucionismo, no esmagamento inevitável dos fracos pelos fortes.
Ao mesmo tempo em que reitera a falta de “integridade étnica” do brasileiro,
Euclides não julgava possível um único tipo étnico no Brasil -- “não temos unidade de raça,não a termos nunca; até porque nenhum país a tem igualmente, por toda parte os cruzamentos sucessivos impediram a conservação do tipo primitivo” – posteriormente, sob o revisionismo pungente que elaborou, passou a ter o sertanejo, segundo ele, um tipo étnico-social diferenciado , como o único elemento de esperança de constituir no Brasil uma população homogênea , porquanto “as vicissitudes históricas o libertaram,na fase delicadíssima de sua formação,das exigências desproporcionais de uma cultura de empréstimo”.
Neste particular, Euclides obedecia à crença na inferioridade dos não-brancos -- mas com uma nuance : enaltecia o sertanejo que detinha vantagens sobre o mulato litorâneo por força de seu isolamento que propiciara evolução racial e cultural mais estável – “o sertanejo é antes de tudo um forte, não tem o raquitismo exaustivo dos mestiços neurastênicos do litoral”. Observa Euclides que “ao invés da inversão extravagante, que se observa nas cidades do litoral, onde funções altamente complexas se impõem a órgãos mal constituídos, comprimindo-os e atrofiando-os antes do pleno desenvolvimento - nos sertões, a integridade orgânica do mestiço desponta inteiriça e robusta, imune de estranhas mesclas, capaz de evoluir, diferenciando-se, acomodando-se a novos e mais altos destinos, porque é a sol ida base física do desenvolvimento moral ulterior."
O sertanejo,no desenho literário-antropológico que construiu, era o resultado da convergência e interação , formando uma ‘sub-raça superior’ (sic) , entre a bravura indígena e a ousadia dos bandeirantes paulistas ,com seu “destino histórico de assaltar o deserto (...)cruzados destemerosos a desencadear a atividade arroteadora e valorizadora dos espaços interiores do território,integrando-os (...)”Na verdade, Euclides edificou a imagem do homem do sertão como um ser autêntico, enraizado na terra, dotado de cultura e evolução próprias e autônomas , capaz inclusive de criar o brasileiro do futuro – como “rocha viva da nacionalidade”.
A rigor, as concepções e considerações étnicas de Euclides acoplam-se, interagem e se intertextualizam com seus conceitos de civilização e o “movimento civilizador” que preconizava – ou processo civilizatório para o qual a República teria sido um decisivo passo. Desde seus primeiros textos,com efeito, o termo e o conceito de “civilização” aparecem uma força histórica e como uma lei natural, até porque inerentes ao ideário positivista e evolucionista, a civilização como o modelo de desenvolvimento para a humanidade. : “a civilização é o corolário mais próximo da atividade humana sobre o mundo; (...) o seu curso, como está, é fatal, inexorável” . Via-a como instrumento de luta intelectual pela construção de uma identidade nacional, que se queria livre de fórmulas invasoras: “Estamos condenados à civilização. Ou progredimos ou desaparecemos.”
nos muitos Euclides, um só
O certo é que permeando e perpassando todas as fases e estágios de sua vida e todas as linhas e entrelinhas de seus escritos,depoimentos e palavras , mais do que matemático,engenheiro,geólogo,geógrafo,historiador,jornalista,articulista,
ensaísta, em especial, um pioneiro no que tange a questões ligadas à ecopolítica, e à etnopolítica no Brasil , prevalece o Euclides pensador ,um intelectual empenhado,permanentemente, na reflexão e formulação de propostas para fazer do Brasil uma nação moderna e afinada com a civilização.