sexta-feira, 20 de novembro de 2009

Euclides, o filme


no próximo dia 24 novembro, 17 hs, a cerimônia de encerramento oficial da Exposição "Euclides Um Brasileiro", na Academia Brasileira de Letras, no Rio de Janeiro, contará também com a exibição do filme A paz é dourada, de Noilton Nunes , sobre Euclides e o lançamento do projeto "Caravanas Euclidianas" que levará a exposição , o filme e palestras [serei um dos palestrantes,como estudioso euclidiano e autor do livro Escritos de Euclides da Cunha:política,ecopolítica,etnopolítica] e oficinas audiovisuais para estudantes e professores por todo o estado do Rio de Janeiro ,e depois para outros estados, durante todo ano letivo de 2010 -- um projeto do MEC coordenado pela UniRio .
não deixem de conhecer esse filme. eis o escrevi sobre ele :

A certa altura de A paz é dourada , o ator Breno Moroni dirige-se a uma platéia, declarando que o “o filme fez-se de partes, de colagens [sic], como uma colcha de retalhos”. As palavras de Moroni e a cena em si -– o ator num depoimento que se dá ‘fora’ do fluxo dramatúrgico, do filme, que refere-se ao filme, mas não faz parte de sua narrativa básica,central,não integra seu fulcro narrativo, o próprio processo de sua realização incorporado ao filme tornando-se um dos fios condutores da narrativa, aparecendo como um elemento do (conhecido) “making of”, comum hoje em material cinematográfico, o que revela também um dos aspectos igualmente importantes do filme : sua modernidade enquanto linguagem e estilo . Modernidade e atualidade de A paz é dourada também no que absorve a tendência,ou prática,ou forma comum no cinema dos últimos tempos no Brasil – exemplos marcantes são os filmes de Eduardo Coutinho, Lucia Murat, Sandra Kogut, por exemplo -- com a inserção de elementos documentários em filmes de ficção, e vice-versa. Só que neste filme o documentário faz ficção , não como ilustração complementar mas como uma representação artística que dá continuidade ao enredo dramatúrgico propriamente dito.Documentário – ficção – documentário - ficção : os quadros e seqüências se integram e interagem e exprimem a forma e o modo como A paz é dourada se desenrola na tela, como se mostra aos olhos do espectador em termos de estrutura e forma, de ritmo, de montagem,sobretudo de dinâmica. Dinâmica – eis um elemento-chave ,termo ou atributo a caracterizar taxativamente a realização cinematográfica – instigante, provocadora, moderna, reflexiva – de Noilton Nunes . Dinâmico, ágil, fluente, intenso, moderno, o filme desenvolve-se e desdobra-se, integra-se e interage-se ,em quadros,planos e seqüências,até mesmo em filmes e subfilmes, filmes dentro do filme, em duas escalas ou níveis básicos,. -- uma dentro do próprio fluxo fílmico – a ficção e a não-ficção : a representação dramática de Euclides, sua vida, sua pessoa, a infância,a juventude, a militância republicana, o trabalho, as profissões de engenheiro e jornalista, as viagens, o pensamento, a obra ; via a vis com o documentário sobre o pano de fundo histórico, os fatos e figuras da época, os locais e cenários, as citações de trechos de seus escritos -- outra, paralela (mas convergente) ao fluxo fílmico principal, de que a cena do depoimento de Breno Moroni é exemplo, de que fazem parte cenas de “teste de elenco”, palavras e discursos de membros da Academia Brasileira de Letras e de intelectuais, comentários e interpretações entre o tempo de Euclides e o Brasil contemporâneo, a reportagem e denúncia sobre o despejo da equipe e equipamentos do estúdio montado em armazém do porto do Rio.Ambas as escalas,ou linhas narrativas, a agilizar o conjunto fílmico, a ilustrá-lo,a torná-lo irresistivelmente atraente a todo e qualquer tipo de espectador, que acompanha o filme como quem “lê” (o que só o cinema possibilita) ao mesmo tempo diversas histórias , a “leitura” de uma se dirigindo,ou desviando, para outra antes de terminar a da anterior, num mosaico de construção cinematográfica – obra do talento do realizador – em que o diapasão de dinâmica-reflexão se propõe a um diálogo, uma interlocução com o espectador,como de resto toda obra de arte deve perseguir.

Dupla escala que também se manifesta em duas balizas,por assim dizer, da feitura do filme : concebido no ano do centenário de nascimento de Euclides (1966),informa Noilton, A paz é dourada deu – se à luz,ou veio à tela, no ano do centenário de morte do escritor (2009). Magnífica e rara integração : um filme que se propõe a tratar da existência de uma personalidade tem sua ‘vida’ balizada por dois marcos da própria vida do focalizado. Mas o filme não se esgota aí. Especificamente no foco sobre a trajetória de Euclides , os dois níveis narrativos transmutam-se em três , pois exibem olhares,ou facetas pouco divulgadas ,retratadas(ao que se sabe nunca filmadas) e estudadas de Euclides : o quanto de seu pioneirismo ,no Brasil, quanto a questões políticas,ecológicas e étnicas. Pioneirismo euclidiano ao qual se integra e equipara o pioneirismo do próprio filme , primeiro a mostrar na tela essas vertentes do pensamento e da obra do escritor. Ao Euclides político,ecopolítico e etnopolítico , prenunciador e antecipador de muitos conceitos nessas searas, incorpora-se e acopla-se o filme também político,ecopolítico e etnopolítico de Noilton Nunes,da mesma forma pioneiro nesse retrato. Colagens e ‘retalhos’, representação e documentário, ficção fílmica e não-ficção fílmica, fulcro principal e ‘making of’, filme e subfilmes, cor e p&b, passado e presente, dinâmica e reflexão,modernidade e pioneirismo –- todos os elementos convergem e se intertextualizam, todo o filme se constrói ,se desdobra e se integra na exibição do perfil de um grande intelectual, empenhado na reflexão sobre o Brasil de seu tempo, ao mesmo tempo pioneiro e precursor no trato de questões absolutamente atuais . Que A paz é dourada capta,representa e reproduz, nas justas medida e dimensão -- e com esse Euclides interage reflexivamente quanto ao País em que vivemos e desejamos.


quarta-feira, 11 de novembro de 2009

a República e os literatos



como os literatos da época se relacionaram com a então nascente República -- resta saber se mais de um século depois ainda provoca reações entre a intelectualidade .