domingo, 18 de janeiro de 2015
OUI, CE SONT CHARLIE- II
"Humor te
m se ser
crítico, senão vira 'secos e molhados'; Imprensa tem de ser oposição, senão é
propaganda". [ Millor
Fernandes]
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Nos jornais brasileiros do final
do século XIX e início do século XX, os leitores encontravam crônicas sobre a
cidade e ocorrências cotidianas, sobre os teatros e os eventos artísticos,
críticas literárias sobre obras recém publicadas, e sobretudo o folhetim,
estampado nos rodapés das folhas, contendo um romance, ou um conto, ou uma
novela. A rigor, desde mais intensamente a década de 1870, todos os periódicos
comportavam uma parte literária – a princípio, e sobremodo, essencialmente
dirigida ao público feminino, mas que no decorrer do tempo ampliando sua
audiência aos homens.
Paralelamente, a fim de atenuar
as ‘seriedade e gravidade’ de notícias (de ordem política, social, do cotidiano
da cidade, etc) e, ao mesmo tempo, quebrar um pouco da sisudez dos jornais --
típica da imprensa do século XIX -- ao arranjo gráfico uniforme, monótono e
maçante dos jornais, as matérias dispostas em colunas corridas, com títulos
discretos e sem muitos atrativos, começava a contrapor-se a tendência de
tratamento jocoso e satírico às matérias e textos publicados, o que além de
quebrar a austeridade editorial-gráfica, funcionava como chamariz para o
leitor, em especial o menos escolarizado e não-letrado. Necessitando de
encontrar recursos para atrair o leitor, as amenidades em forma de folhetins,
poesias e contos, acompanhados de farto material iconográfico, quebravam a
monotonia das linhas corridas.
Assim, os registros cômicos
seriam uma das maneiras de representação de impasses e temporalidades diversas
da história brasileira, a partir no período inaugurado pela abolição e pela
República. Tais registros eram fruto de um círculo de humoristas concentrados
no Rio de Janeiro, desde então a efetiva capital cultural do país --
utilizando-se do humor para problematizar questões urbanas, administrativas e
sociais da capital do Império, satirizar instituições, ironizar fatos e
personalidades, e até ridicularizar os próprios leitores.
Nesse contexto inseria-se
O RIO-NU, periódico bissemanal, exemplarmente integrado ao elenco que então
começara a sedimentar-se no jornalismo da recém-implementada República : a
imprensa de cunho arrivista, galhofeira, de humor malicioso, cáustico, com
tinturas de conotações sexuais e até mesmo pornográficas. Fundado em 1898,
circulou até 1916, dirigido por J. Brito, redigido por jovens integrantes da
denominada boemia literária da Belle époque, consolidou-se a partir de 1900 como
o principal representante, exemplo e referência para diversas outras
publicações do mesmo gênero coexistentes na época -- com farta matéria
iconográfica, e sobretudo espírito satírico, sarcástico, debochado,
iconoclasta.
[ Arthur Azevedo em O Rio –Nu do
ano de 1903 – apenas publicado originalmente no jornal -- estará no livro que
preparei “ Contos e crônicas inéditos de Arthur Azevedo em O Rio-Nu” (a
publicar pelos 450 anos do Rio)
O RIO-NU, 'frére hebdomaidaire'
do CHARLIE HEBDO
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