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terça-feira, 1 de abril de 2014
125 anos do golpe militar
neste 1o. de abril em que se registram os 50 anos do golpe militar de 1964 [ não se iludam quanto à data exata : o 31 de março foi inventado pelos golpistas para fugir ao 'dia da mentira', 'dia do engodo' ] neste 10. de abril, dizia, vale reportar ao primeiro golpe militar anti-institucional imposto ao país -- no qual, ao contrário de 1964,quando postaram-se, e durante os 21 anos da ditadura, contrários, opositores, até mesmo militantes, os intelectuais e literatos oitocentistas de um modo geral puseram de imediato em franco apoio, mas logo logo desiludiram-se.enquanto isso, o povo "bestializado", cf. José Murilo de Carvalho, inerte e amorfo, indiferente -- ao passo que no segundo golpe militar parte da população, representada pela classe média, ilusoriamente aplaudiu e saiu às ruas...
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Os
literatos e o golpe de 1889
Embora não tenha produzido
correntes ideológicas próprias ou novas concepções estéticas, a geração de
intelectuais, solidamente arraigados nas teorias cientificistas de 1870, e todo
o espírito progressista da época pareciam estar com a República, apoiada pela
maçonaria, pelo positivismo e pelas correntes que se julgavam “desassombradas
de preconceitos”, as idéias circulando mais livremente num ambiente que
Evaristo de Moraes qualificou de “porre
ideológico” , um verdadeiro mosaico no
qual era predominante o liberalismo,mas que abrigava alguma voga de anarquismo e simpatias
explícitas ao socialismo. Sob os
princípios genéricos do liberalismo, o grupo intelectual definira a
tarefa que lhes cabia ; contribuir e propugnar por uma ampla, profunda ação
conjunta para construir a nação e
remodelar e fortalecer o Estado.
Já no 15 de novembro de 1889 registraram sua total adesão : numeroso grupo
de republicanos,junto com gente da rua, tendo à frente José do
Patrocínio,Aníbal Falcão, João
Clapp,Campos da Paz, Olavo Bilac, Luis Murat e Pardal Mallet - estes três pela
primeira vez movidos à ação política concreta-- dirigiu-se à sede da Câmara,
aos gritos de viva à República, e redigiram moção de apoio aos chefes da
insurreição militar nestes termos :
“Os abaixo assinados,órgãos
espontâneos do povo do Rio de Janeiro, representam o governo
provisório,instituído após gloriosa revolução que ipso facto extinguiu a
monarquia no Brasil,a necessidade urgente da proclamação da República.
Excelentíssimos srs.
representantes supremos das classes militares do Brasil, marechal Deodoro da
Fonseca,chefe de divisão Wandenkolk e tenente-coronel dr. Benjamin Constant.
O povo do Rio de Janeiro, reunido
em massa no edifício da Câmara Municipal, tem a honra de comunicar-vos que, por
meio de diversos órgãos espontaneamente surgidos e pelo seu representante
legal, proclamou como nova forma de
governo nacional a República.
Esperam os abaixo
assinados,representantes do povo do Rio de Janeiro, que o patriótico governo
provisório sancione o ato pelo qual,instituindo a República, se pretende
satisfazer a íntima aspiração do povo brasileiro. Viva a República Brasileira !
Vivam o Exército e a Armada nacionais ! Viva o povo do Brasil !
O entusiasmo adesista dos
intelectuais era generalizado; em outro manifesto, dirigido ao Governo
Provisório instalado a 16 de novembro, assinado por alguns homens de letras em
22 de novembro :
“O povo, e quando dizemos povo referimo-nos
àquela grande parte da nação que os aristocratas de todos os tempos chamaram
desdenhosamente o terceiro e quarto estado, donde, reparai bem, em sua maioria
saiu sempre o nosso glorioso Exército; os homens de letras, e quando dizemos os
homens de letras referimo-nos a todos aqueles que tomando a si os encargos
intelectuais da pátria foram, no curso de quatro séculos, os fatores mais enérgicos e mais desinteressados de
nosso progresso; plebe e pensadores, sempre estas duas forças caminharam aqui
unidas !... Agora mesmo no fato extraordinário que é o espanto da Europa e o
júbilo da América na proclamação da República,as duas grandes forças lá estão
ungidas uma a outra... A era das grandes lutas da política responsável abriu-se
definitivamente para os brasileiros... A pátria abriu as largas asas em
direitura à região constelada do progresso; a literatura vai desprender também
o vôo para acompanhá-la de perto. Ao futuro ! ao futuro,modeladores de
povos,construtores de nações !
No clamor pela ampliação da
atuação do Estado sobre a sociedade aliavam-se a homens públicos, políticos,
jornalistas, até mesmo cafeicultores e industriais ,e a esse grupo
juntar-se-ia os grupos militares
defensores e sequiosos de maior participação dos militares na política— o que mais tarde não causaria surpresas
quando do progressivo e acentuado
fortalecimento dos governos republicanos a partir de Floriano Peixoto.
As reformas que preconizavam, no
entanto, perderam-se no processo político republicano. Na consolidação do novo
regime ,dando-se por meio de um processo caótico e dramático, malograram-se
seus esforços cientificistas ,reformadores, inovadores na criação daquele
‘saber sobre o brasil’.
Cedo, muito cedo, já nos primeiros anos do século XX
desiludiam-se : “Está tudo mudado:
Abolição, República... Como isso mudou ! Então, de uns tempos para cá parece
que essa gente está doida”, vaticina Isaias Caminha , sob a pena de Lima Barreto. José Veríssimo, em “Vida
literária” (revista Kosmos, n. 7,1904) , descreve : “Todos se presumiam e diziam
republicanos,na crença ingênua de que a República, para eles palavra mágica que
bastava à solução de problemas de cuja dificuldade e complexidade não
desconfiavam sequer, não fosse na prática perfeitamente compatível com todos os
males da organização social, cuja injustiça os revoltava”. Ainda em outubro
de 1890, antes do primeiro aniversário do 15 de novembro, desencantava-se Silva
Jardim, lamentando em carta a Rangel Pestana : “Comunico-lhe que parto para
a Europa, a demorar-me o tempo preciso a que esta País atravesse o período
revolucionário de ditadura tirânica e de anarquia...” . “Esta não é a
República de meus sonhos”. lamentou-se Lopes Trovão, um dos próceres do
movimento republicano. “Foi para isso
então que fizeram a República ?”, protestou Farias Brito.
Difícil de manter uma convivência pacífica
entre a República política e a ‘Republica das letras’, agravado pela crescente
insatisfação popular com o novo regime, exposta
em agitações de rua, episódios
violentos, revoltas e movimentos de protesto – e mais ainda com os novos
costumes e práticas de desenfreada especulação financeira, a busca de enriquecimento a qualquer custo,o advento
de um capitalismo predatório levando ao encilhamento, a escandalizar Taunay que
via “uma degradação da alma nacional”
e a decepcionar republicanos
ardorosos como Raul Pompéia (“A república
discute-se consubstanciada no Banco da República”).
No campo político, até que
mantiveram-se passivos diante da “ditadura tirânica” e aceitaram as coligações
de Deodoro da Fonseca com as forças mais conservadoras do Brasil agrário, mas as esperanças
esfacelaram-se diante da índole e prática repressoras do governo Floriano
Peixoto , quando se deu um cisma profundo entre os literatos e alguns dos
antigos entusiastas da República tiveram de fugir do Rio de Janeiro para evitar
a prisão, como Olavo Bilac e Guimarães Passos. Passado o momento inicial de
esperança, desfeito o caminho almejado
da democratização do País prometida em comícios, conferências públicas,na imprensa
radical, consolidada a vitória da ideologia reforçadora do poder oligárquico,
derrotados,desapontaram-se as elites, desapontaram-se os trabalhadores e o
povo, desapontaram-se os intelectuais ,
que desistiram da política militante e se concentraram na literatura.
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