sábado, 31 de agosto de 2013

A propósito da Bienal do Livro – e de feiras e festas literárias

A cada ano, quando da realização de Bienal do Livro – como agora, de 29.08 a 08.09, no Rio de Janeiro – reportamo-nos às discussões e análises que ora se intensificam e desdobram  com relação à Bienal do Livro -- cuja última edição,em São Paulo,2012, mostrou-se esvaziada,’fisicamente’  por parte e no seio do próprio meio editorial-livreiro, haja vista p. ex. grandes editoras estarem  ausentes,sob argumentação de "custos exorbitantes" e "parcos resultados", e conceitualmente por força do crescente  pensamento crítico quanto ao tradicional "modelão”,ou "formatão" da Bienal (assim são definidos pelos profissionais do ramo), ao mesmo tempo em que as atenções se voltam cada vez mais para os eventos regionais, essa profusão (benéfica,digo eu) de festas e feiras pelo país: Belém, Fortaleza,Recife,Ouro Preto, Paraty, Porto Alegre,Passo Fundo (estas duas últimas bastante tradicionais, já de longa data).
Com efeito, as  diversas festas e feiras literárias regionais e específicas que se multiplicam pelo país a cada ano, constituem-se  claramente em  geradores de  elementos de reflexão acerca de eventos literários e de novos cenários, ou novas vertentes dos cenários editorial e livreiro,por extensão literários, do país – a proliferação de eventos e feiras de livros contrapostos,  por suas estruturas,escopo,focos e enfoques, ‘conceitualmente’ à  Bienal e seu formato tradicional.
Via de regra, todos transcendem o modelo comum de eventos de exposição e venda de livros para se constituírem em notáveis cenáculos temáticos, expressos em painéis, palestras, breves simpósios, mesas-redondas,oficinas, depoimentos – muitos voltados para a leitura,seus fomento,estímulo e prática.
 Persiste o intento, entre editores, livreiros e profissionais do setor, de fortalecimento e incremento a esses eventos regionais, os quais -- tanto por suas próprias concepções como pelas efetivas programações realizadas até aqui --têm oferecido os elementos de uma presente reflexão conceitual sobre a Bienal : constituir-se menos em cenários de venda e exposição de livros e mais de  incentivo a leitura – certo é que nas últimas edições a Bienal tem, embora de modo incipiente e algo disperso, incrementar certos painéis,mesas-redondas, debates, até mesmo ligeiras oficinas acerca de temas específicos, reflexões sobre literatura, promoção da leitura,etc(nesta, no Rio de Janeiro, inaugura-se um “Salão de Negócios”, nos três primeiros dias, entre editores nacionais e estrangeiros e agentes literários, nos moldes do que ocorre, por exemplo, em Frankfurt.)
Mais uma vez, o momento é propício e oportuno  para reflexões,meditações amplas e profundas,reformulações de pensamentos e concepções,e sobretudo ações concretas de superação de incompreensões e distorções conceituais..

Em minha opinião, ainda vejo extrema validade na Bienal -- mesmo sob as formas de seus  'modelão,formatão'; sendo como sempre frequentada pelos contingentes daqueles parcos e raros leitores para os quais todas as pesquisas apontam a média de leitura de ...  2 livros por ano (!); ainda que com as características de ‘feirão’,cenários ‘circenses’, etc  -- evidentemente admitindo, e concordando plenamente, com a necessidade de certas alterações, ajustes, como em especial o incentivo maior a realização de oficinas,painéis,debates, etc. A validade que sustento tem em vista o chamado 'grande público', por força do comprovado fato de a Bienal representar a contrapartida real,concreta, a um tipo de comportamento desse '(não)leitor comum': sua relação com a livraria, tida e vista por ele como uma espécie de 'templo sagrado', espaço ‘sacralizado’ -- apesar de tudo em termos de atrativo,utilidade, conforto, etc que as livrarias oferecem hoje (café,poltronas,ambientes de leitura,etc) -- a inibi-lo e refrear sua possibilidade de chegar ao livro. Na Bienal, justamente por seu ‘modelão’ -- que de resto permite uma exposição mais abrangente quase completa, do conjunto dos acervos de editoras -- por seus cenários 'populares' e descontraídos[sic], propicia um sensível processo de dessacralização...

Bienal do Livro, feiras e festas literárias, essencialmente reportam ao livro e à leitura. Referi-me aos “(...) parcos e raros leitores para os quais todas as pesquisas apontam a média de leitura de ... 2 livros por ano[!]”: talvez alguns dos que aqui me lerem  venham a contra-argumentar que na verdade o índice de leitura do brasileiro,apontado pela recente pesquisa “Retratos da Leitura no Brasil” – e registrado no oportuno livro sob mesmo título(org.Zoara Failla;edição IPL e Imprensa Oficial.) – é na verdade de 4(quatro) livros por ano,e não 2. Sim, o número em ‘estado bruto’ é esse, mas excluídas as obras indicadas pelas escolas e aquelas compradas pelo governo para distribuição à rede escolar e bibliotecas, e considerada apenas a leitura espontânea chegamos à  lamentável  marca que registrei.

Em minha opinião, até mesmo por meu latente ceticismo com relação às estatísticas de modo geral, (já houve quem dissesse: “números são como biquínis femininos: mostram muito mas escondem o essencial...”), ainda mais as formuladas cá no Brasil, questiono esses cenários de um modo geral . Todos os levantamentos,pesquisas e computações retratam,reportam-se e registram, no tocante a índices de leitura, de produção, de vendas, de faturamento, etc, única e exclusivamente os dados inerentes a livros impressos – sem catalogar, até porque não existem ainda mecanismos para tal [por indolência e ‘inércia’,por certo relutância (sic) de editores,livreiros,etc , face a suas respectivas posturas diante do elemento a que vou me referir a seguir], esses mesmos  dados para os livros digitais e todas as formas e meios de leitura intensamente,e irreversivelmente, presentes hoje, nos tablets,iPads,iPhones,portais,sites, diversos links pela internet e demais plataformas digitais.
       Vou adiante para uma desafiadora conclusão: lê-se mais que as (incompletas) estatísticas apontam; e produz-se e vende-se muito mais hoje no Brasil, e em todas  faixas etárias e todos os tipos de textos.

O que quero dizer : o digital faz crescer os índices de leitura no Brasil ! quando sustento que lê-se muito mais no meio digital do que revelam as simples(e simplórias) estatísticas sobre vendas , e leitura, de e-books, se já não bastasse citar o quanto de textos,obras e narrativas literárias que se abrigam,e são consultadas e 'downlonizadas' por milhares de pessoas diariamente, nos portais e sites de literatura, nos blogs, nas redes sociais, na internet como um todo . Um exemplo marcante : a coletânea Geração subzero (org. Felipe Pena;editora Record.), reunindo textos veiculados exclusivamente no twitter -- com um subtítulo bastante significativo, “20 autores congelados pela crítica, mas adorados pelos leitores” – e entre eles alguns ‘campeões de vendas’ no mercado (formal)  livreiro, como  Thalita Rebouças, André Vianco. Outro exemplo :  a editora Intrínseca veiculou  diariamente, em seu twitter, o texto “Caixa preta”, da americana Jennifer Egan, escrito originalmente em bloquinhos de até 140 caracteres -- no que,aliás, Claudio Soares fora pioneiro, ao 'tuitar', ainda em 2006, fragmentada em posts, sua (excelente) obra Santos Dumont número 8. Além dos exemplos das (já) centenas de obras convertidas em versões de aplicativos para iPad e iPhone.
      As ações e realizações em blogs, no Facebook, no twitter , em diversas plataformas constituem exemplos claros, taxativos, do que vem sendo chamado de narrativas digitais, literatura eletrônica ou narrativas em rede, uma 'literatura eletrônica" caracterizada basicamente por interatividade, hipertextualidade,não- linearidade, multimídia -- contundente,e inquestionável prova de como o criar textos literários - ficcionais e não-ficcionais - construir narrativas,contar histórias vem sendo remodelado com e pelas novas tecnologias,gerando em especial novos,e nunca tão dinâmicos na história cultural,modos,meios e formas de leitura,conhecimento.aprendizado,entretenimento, lazer e de novos comportamentos. Vale dizer, obras e textos em mídias, veículos e suportes outros que não aqueles metódica e estatisticamente computados.  Tudo, enfim, a exigir profundas e sérias reflexões.
Então (sem chegar a ser uma conclusão, porquanto temos de avançar vigorosamente em todas as reflexões possíveis e praticar todas as ações necessárias), dispostos uns, subjacentes outros, encontram-se muitos elementos, tópicos e questões a permear indissoluvelmente a leitura,e inerente a ela, o livro, no país.Que a Bienal,as festas literárias regionais auspiciosamente em proliferação,  o meio e a mídia digital a proporem e propiciarem notáveis perspectivas de difusão da matéria literária e de circulação do conteúdo do livro e,por extensão das oportunidades,possibilidades e fomento da leitura, tudo isso seja efetivamente incorporado,crescente e consistentemente, na agenda de todos os setores e searas  educacional-cultural,editorial,livreira e mesmo social.




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