quinta-feira, 8 de novembro de 2012

Sobre festas, f eiras e eventos literários -- e novos modelos e formatos,modos e meios


É tempo de  reflexões  inerentes a possíveis (para muitos, almejadas) vertentes não apenas especificamente para os  cenários editorial e livreiro, por extensão literários, do país no momento, mas também generica e essencialmente das práticas e  modos de leitura – tema sempre recorrente,imperioso na vida cultural de qualquer nação.

Três eventos literários, no Rio de Janeiro, realizados com bastante  sucesso e expressividade,e de farta repercussão , são extremamente representativos  da  geração  de elementos  para tais reflexões: a 12ª.. "Primavera dos Livros,dada a público no Museu da República, em setembro (e que em  novembro retomará sua edição paulistana), a congregar editoras não entre as maiores  mas por certo algumas das mais operosas; o “FIM - Fim de Semana do Livro no Porto”, ocupando apoteoticamente o Morro da Conceição, em  outubro, uma ‘récita’ de palestras e diálogos em torno do livro e da literatura, a reunir um timaço de escritores,editores,livreiros,jornalistas,intelectuais de diversos naipes; ainda no Rio acrescente-se, agora em novembro : a FLUPP- Festa Literária Internacional das UPPs” (de 07 a 11),  no Morro dos Prazeres,com debates, performances, música e leituras, trazendo em si conotações e características diferenciadas e bastante significativas, em especial proposta a se consolidar como importante vetor de exposição,informação e difusão da agora denominada “literatura\ cultura  da periferia”; a “Fliaraxá - Festival Literário de Araxá (de 08 a 10), o primeiro na cidade mineira abrigando encontros  com vários escritores (Zuenir Ventura, Fabrício Carpinejar, Luis Fernando Veríssimo e Milton Hatoum, entre outros);  a “Fliporto --  Festa Literária  Internacional de Pernambuco (de 15 a 18),em sua 8ª. edição  -- já tradicional,, que abriga inclusive um Congresso Literário (!), a reunir escritores nacionais e internacionais em painéis com palestras, entrevistas e debates,
Todos eles a transcender o  escopo de um evento de exposição e venda de livros para se constituir em notável cenáculo temático, tendo – em painéis,palestras,diálogos,depoimentos – a Leitura,seus fomento,estímulo e prática, e o Livro, suas formas,formatos e significados, como tema,mote e leitmotiv.
Quando menciono esses eventos se constituírem em verdadeiros geradores de  reflexão  reporto-me de imediato às discussões e análises que ora se dão, com maior intensidade, com relação à bienal do Livro, cuja recente edição,em São Paulo, mostrou-se esvaziada,’fisicamente’  por parte e no seio do próprio meio editorial-livreiro, e conceitualmente por força do crescente  pensamento crítico quanto ao tradicional "modelão”,ou "formatão" (assim são definidos pelos profissionais do ramo) da bienal, ao mesmo tempo em que as atenções se voltam cada vez mais para os eventos regionais, essa profusão (benéfica,digo eu) de festas e feiras pelo país(Belém, Fortaleza,Ouro Preto, Paraty, Porto Alegre,Passo Fundo -estas duas últimas bastante tradicionais, já de longa data): persiste mesmo o intento, entre editores, livreiros e profissionais do setor, de fortalecimento e incremento a esses eventos regionais , os quais -- tanto por suas próprias concepções como pelas efetivas programações realizadas até aqui --têm oferecido os elementos de uma presente reflexão conceitual sobre festas literárias : constituírem-se menos em cenários de venda e exposição de livros e mais de  incentivo a leitura – certo é que nas últimas edições a bienal tem, embora de modo incipiente, incrementar certos painéis,mesas-redondas, debates, até mesmo ligeiras oficinas acerca de temas específicos, reflexões sobre literatura, promoção da leitura,etc. As feiras regionais,e festas literárias como “Primavera dos Livros”,“FIM”, “FLUPP”,”Fliaraxá”, “Fliporto”, com efeito oferecem  o que faz parte das proposições preconizadas para  reformulação conceitual da bienal.
Só que... .entendo que o assunto, e a questão, vão muito além, a exigir reflexões,meditações amplas e profundas,reformulações de pensamentos e concepções,e sobretudo ações concretas de superação de incompreensões e distorções conceituais. Especificamente a requerem considerações e observações justamente acerca do livro e da leitura no país.
Para início de conversa, 
em minha opinião: ainda vejo extrema validade na bienal -- mesmo sob as formas de seus  'modelão e formatão, frequentada pelos contingentes daqueles parcos e raros leitores para os quais todas as pesquisas apontam a média de leitura de ...  2 livros por ano (!); ainda que com as características de ‘feirão’, etc  -- evidentemente admitindo, e concordando plenamente, com a necessidade de certas alterações, ajustes e adaptações. A validade que sustento tem em vista o chamado 'grande público', por força do comprovado fato de a bienal representar a contrapartida real,concreta, a um tipo de comportamento desse '(não)leitor comum': sua relação com a livraria, tida e vista por ele como uma espécie de 'templo sagrado', espaço de sacralização -- apesar de tudo em termos de atrativo,utilidade, conforto, etc que as livrarias oferecem hoje (café,poltronas,ambientes de leitura,etc) -- a inibi-lo e refrear sua possibilidade de chegar ao livro. Na bienal, justamente por seu ‘modelão’ -- que de resto permite uma exposição mais abrangente quase completa, do conjunto dos acervos de editoras -- por seus cenários 'populares' e descontraídos[sic], propicia um sensível processo de dessacralização.Ainda mais se propostas,como tem ocorrido gradativamente (mas ainda  incipiente),expandir alguns focos no temático,como de resto anotei
        Mas... por  outro lado -- ou acima de todos os lados -- um espectro ronda (alvissareiramente, saúdo eu) a bienal e as livrarias, por extensão as editoras, a totalidade do mundo editorial-livreiro: o e-commerce, notável em sua propriedade (benfazeja,enfatizo) de mudar a relação do leitor,e do produtor e do revendedor, com o livro -- dinamizando-a,enriquecendo-a,valorizando-a, aprimorando-a.

'esqueceram' do digital ?

Bem, referi-me aos “(...) parcos e raros leitores para os quais todas as pesquisas apontam a média de leitura de ... 2 livros por ano[!]”: talvez alguns dos que aqui me lerem  venham a contra-argumentar que na verdade o índice de leitura do brasileiro,apontado pela recente pesquisa “Retratos da Leitura no Brasil” – e registrado no oportuno livro sob mesmo título(org.Zoara Failla;edição IPL e Imprensa Oficial.) – é na verdade de 4(quatro) livros por ano,e não 2. Sim, o número em ‘estado bruto’ é esse, mas excluídas as obras indicadas pelas escolas e aquelas compradas pelo governo para distribuição à rede escolar e bibliotecas, e considerada apenas a leitura espontânea chegamos à  lamentável  marca que registrei.
Aliás, aproveitemos a oportunidade e examinemos certos números e determinados fatos inerentes ao levantamento "Produção e vendas do setor editorial brasileiro", realizado pela Fipe por encomenda da CBL e do SNEL. Por exemplo, se o mercado editorial cresceu 7,2% em volume -- o brasileiro comprou 3,34% mais, e o governo, 13,7% mais- e  7,36% em faturamento em 2011, comparativo a 2010, computado o efeito da inflação (6,5% pelo IPCA), o aumento real foi de ... irrisório 0,81%; e – atenção ! -- o governo,que representa 39,5% do mercado, teve papel fundamental nos números do faturamento do setor, uma vez que as vendas de livros para programas e órgãos governamentais tiveram crescimento de 21,2% (valor não deflacionado).E ao se considerarem os dados de mercado (que engloba todas as vendas com exceção daquelas para governo), o cenário mostra que o setor cresceu em faturamento 3%, mas, levando-se em conta a inflação, houve queda real de 3,27%.
Bem, há de se considerar por outro lado,segundo  estudo recém-publicado pela Associação Internacional dos Editores ([IPA, na sigla em inglês]que o mercado de livros no Brasil, com R$ 6,2 bilhões de faturamento (a CBL mediu em R$ 4,8 bilhões em 2011) e 469,5 mil exemplares vendidos, cresce e já aparece como 9º no mundo..
Em minha opinião, são questionáveis esses cenários de um modo geral . Todos os levantamentos,pesquisas e computações retratam,reportam-se e registram, no tocante a índices de leitura, de produção, de vendas, de faturamento, etc, única e exclusivamente os dados inerentes a livros impressos – sem catalogar, até porque não existem ainda mecanismos para tal, esses mesmos  dados para os livros digitais e todas as formas e meios de leitura intensamente,e irreversivelmente, presentes hoje, nos tablets,iPads,iPhones,portais,sites, diversos links pela internet e demais plataformas digitais.
       Vou adiante para uma desafiadora conclusão: lê-se mais que as (incompletas) estatísticas apontam; e produz-se e vende-se muito mais hoje no Brasil, e em todas   faixas etárias e todos os tipos de textos !

e-books : claras inverdades e ... realidades nítidas

Em outra – melhor dizer : paralela – seara, pesquisa da Câmara Brasileira do Livro- CBL e do Sindicato Nacional dos Editores de Livros- SNEL cataloga o lançamento em 2011 de 5.235 títulos no formato digital, e aponta começarem eles a fazer presença e ganhar corpo  no panorama editorial cerca de 9% dos mais de 58 mil títulos totais lançados em 2011. E as vendas de e-books começam a ganhar volume com lançamentos simultâneos nos meios físico e on-line.
A mim, soa algo inócuo o alardear um (discutível)“fiasco das vendas dos e-books”[sic], continuo a pouco acreditar nessa conclusão. Concomitantemente, em especial as editoras deveriam estar atentas e agradecer pelo que os e-books estão a lhes proporcionar: dados fornecidos pelos aplicativos que os leitores de e-books usam, quanto a tipos de obras e autores, gêneros, frequência de leitura, extensão das obras, etc propiciam a livrarias digitais -- e editoras -- definir estratégias de mercado: o Saraiva Digital Reader, aplicativo da livraria Saraiva para várias plataformas, coleta dados como o tempo de leitura e os dias da semana em que o usuário mais lê ( e nos EUA,  a Barnes & Noble,com a coleta de dados sobre os leitores, decidiu lançar uma seção de livros curtos depois de ver que seus leitores costumavam abandonar obras longas de nãoficção pelo meio). Quer dizer: : ao contrário do livro impresso -- lido e manuseado pelo leitor na privacidade,sem oferecer indícios e elementos de seus hábitos,gostos e ritmos de leitura, os e-books tornam-se instrumentos fundamentais de formulação de estratégias e ações editoriais e comerciais por editoras e livrarias. Surgiria, por certo, a questão -- a que leitores de todos os matizes podem responder  : muito bom para elas, mas será isso bom para vc.?        
        Considero isso ótimo: não vejo nenhum tipo ou grau de 'invasão de privacidade'.
       Para arrematar: o digital faz crescer os índices de leitura no Brasil ! quando sustento que lê-se muito mais no meio digital do que revelam as simples(e simplórias) estatísticas sobre vendas , e leitura, de e-books, se já não bastasse citar o quanto de textos,obras e narrativas literárias que se abrigam,e são consultadas e 'downloanizadas' por milhares de pessoas diariamente, nos portais e sites de literatura,em blogs, nas redes sociais como um todo. Um exemplo marcante: a coletânea Geração subzero (org. Felipe Pena;editora Record.), reunindo textos veiculados exclusivamente no twitter -- com um subtítulo bastante significativo, “20 autores congelados pela crítica, mas adorados pelos leitores” – e entre eles alguns ‘campeões de vendas’ no mercado (formal)  livreiro, como  Thalita Rebouças, André Vianco. Outro exemplo: a editora Intrínseca vem publicando diariamente, em seu twitter, o texto “Caixa preta”, da americana Jennifer Egan, escrito originalmente em bloquinhos de até 140 caracteres -- no que, aliás,o e-publisher  Claudio Soares fora pioneiro, ao 'tuitar', ainda em 2006, fragmentada em pedacinhos, sua (excelente) obra Santos Dumont número 8..
      As ações e realizações em blogs, essas ações no twitter e em geral nas  redes sociais constituem exemplos claros, taxativos de algo que vem sendo chamado de narrativas digitais, literatura eletrônica ou narrativas em rede, uma 'literatura eletrônica" caracterizada basicamente por interatividade, hipertextualidade,a não linearidade, a multimídia -- contundente,e inquestionável prova de como o criar textos literários, construir narrações,contar histórias vem sendo remodelado com e pelas novas tecnologias,gerando em especial novos,e nunca tão dinâmicos na história cultural,modos,meios e formas de leitura,conhecimento.aprendizado,entretenimento, lazer e de novos comportamentos.[e principalmente estimulando meu ceticismo com relação a tantas estatísticas que proliferam pela aí...]
        Vale dizer, obras e textos em mídias, veículos e suportes outros que não aqueles metódica e estatisticamente computados. 

☺ Então (sem chegar a ser uma conclusão, porquanto temos de avançar vigorosamente em todas as reflexões possíveis e praticar todas as ações necessárias), dispostos uns, subjacentes outros, encontram-se muitos elementos, tópicos e questões a permear indissoluvelmente o livro, e inerente a ele, a leitura no país. Que, de um lado, a bienal,as festas literárias regionais e  aquelas dotadas de especificidades ,auspiciosamente proliferantes hoje, expressivas de uma alentada reconceituação de eventos ; per se, o meio e a mídia digital a proporem e propiciarem notáveis perspectivas de difusão da matéria literária e de circulação do conteúdo do livro e,por extensão das extensões, oportunidades,possibilidades e fomento da leitura --- tudo isso seja efetivamente incorporado,crescente e consistentemente, na agenda de todos os setores e searas  educacionais-culturais,editoriais,livreiras, literárias,intelectuais e mesmo sociais.






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