domingo, 22 de julho de 2012

um inédito de Santos Dumont


 É tempo de Santos Dumont :  este 23 julho marca 80 anos de sua morte (1932); e no 20 julho (sexta-feira passada) ,há 139 anos (1873) dava-se seu nascimento
 excertos do texto de sua inédita autobiografia"O que eu vi, O que nós veremos",escrito no ano de 1918 em sua casa em Petrópolis (hoje atração turística-cultural da cidade) – a que ele mesmo deu a denominação de “A Encantada”.
Publicarei a obra em edição especial aqui em Petrópolis

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O que eu vi, O que nós veremos.

Estas notas são dedicadas aos meus patrícios  que desejarem ver o nosso céu povoado pelos  Pássaros do Progresso
                                                             Nova York, 15 de maio de 1918
                                                                                 Santos Dumont, Inventor
 (...)
A princípio tinha-se que lutar não só contra os elementos, mas também contra os preconceitos: a direção dos balões e, mais tarde, o vôo mecânico eram problemas "insolúveis".
Eu também tive a honra de trabalhar um pouco, ao lado destes bravos, porém o Todo Poderoso não quis que o meu nome figurasse junto aos deles.
As primeiras lições que recebi de aeronáutica foram-me dadas pelo nosso grande visionário: Júlio Verne. De 1888, mais ou menos, a 1891, quando parti pela primeira vez para a Europa, li, com grande interesse, todos os livros desse grande vidente da locomoção aérea e submarina. Algumas vezes, no verdor dos meus anos, acreditei na possibilidade de realização do que contava o fértil e genial romancista; momentos após, porém, despertava-se, em mim, o espírito prático, que via o peso absurdo do motor a vapor, o mais poderoso e leve que eu tinha visto. Naquele tempo, só conhecia o existente em nossa fazenda, que era de um aspecto e peso fantásticos; assim o eram, também, os tratores que meu pai mandara vir da Inglaterra: puxavam duas carroças de café, mas pesavam muitas toneladas... Senti um bafejo de esperança quando meu pai me anunciou que ia construir um caminho de ferro para ligar a fazenda à estação da Companhia Mogiana; pensei que nestas locomotivas, que deviam ser pequenas, iria encontrar base para a minha máquina com que
realizar as ficções de Júlio Verne. Tal não se deu; elas eram de aspecto ainda mais pesado. Fiquei, então,certo de que Júlio Verne era um grande romancista.
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(...)
No dia 13 de julho de 1901, às 6 horas e 41 minutos, em presença da Comissão Científica do Aero Club,parti para a Torre Eifel. Em poucos minutos, estava ao lado da torre; viro e sigo, sem novidade, até o Bois de Boulogne. O sol, mostra-se neste momento e uma brisa começa a soprar, leve, é verdade, porém, bastante,nessa época, para quase parar a marcha da aeronave. Durante muitos minutos, o meu motor luta contra a aragem, que se ia já transformando em vento. Vejo que vou sair do bosque e talvez cair dentro da cidade.
Precipito a descida e o aparelho vem repousar sobre as árvores do lindo parque do Barão de Rotschild. Era necessário desmontar tudo, com grande cuidado, afim de que não se danificasse, pois pretendia reparar minha embarcação para concorrer de novo ao prêmio Deutsch.
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(...)

Reposto o balão e estado de funcionar, revistas e consertadas todas as suas peças, cheio de novo, fiz experiências preliminares. Convocada novamente a Comissão do Aero Club, parti para a Torre Eiffel que circunaveguei de novo; mas, ao voltar, desarranjou-se-me a máquina nas alturas do Trocadero. Manobro para escolher um bom lugar para descer. Supunha ter sido feliz em minhas manobras e esperava descer em uma rua, quando ouço um grande estrondo, grande como o de um tiro de canhão; era a ponta do balão que, na descida, que foi rápida, tocara o telhado de uma casa.
Um saco de papel cheio de ar, batido de encontro a uma parede, arrebenta-se, produzindo um grande ruído; pois bem, o meu balão, saco que não era pequeno, fez um barulho assim, mas... em ponto grande.
Ficou completamente destruído.Não se encontrava pedaço maior do que um guardanapo!
Salvei-me por verdadeiro milagre, pois fiquei dependurado por algumas cordas, que faziam parte do balão, em posição incomoda e perigosa, de que me vieram tirar os bombeiros de Paris.
Os amigos e jornalistas me aconselharam a ficar nisso e não continuar em minhas ascensões, da última das quais me salvara por verdadeiro milagre. O conselho era bom, mas eu não pude resistir à tentação de continuar; não sabia contrariar o meu temperamento de sportsman.
Convoquei-os para nova experiência daí a três semanas. Eu sabia dos elementos com que podia contar; já conhecia, em Paris, umas vinte casas especialistas, cada qual, de um trabalho, e já tinha conquistado a simpatia dos contramestres e operários de quem podia esperar a maior dedicação e serviço rápido.
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(...)
Eu, para quem já passou o tempo de voar, quisera, entretanto, que a aviação fosse para os meus jovens patrícios um verdadeiro sport.
Meu mais intenso desejo é ver verdadeiras escolas de aviação no Brasil. Ver o aeroplano – hoje poderosa arma de guerra, amanhã meio ótimo de transporte - percorrendo as nossas imensas regiões, povoando o nosso céu, para onde, primeiro, levantou os olhos o Padre Bartolomeu Lourenço de Gusmão.
                                                                                                                  Santos  Dumont












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