sexta-feira, 13 de fevereiro de 2009

ainda por um São Paulo x Rio - VIII

Em contrapartida, o futebol recebia interpretações distintas ao longo do tempo: caso, por exemplo, do escritor e jornalista Antônio de Godói,a princípio interessado pelo esporte, em artigo de 22 de dezembro de 1920 já considera o futebol moda que haveria de passar , uma coisa “brutal, perigosa, intolerável",concluindo que “esse esporte devia ser repelido como nocivo à integridade física da geração que despontava”.
Caso também de Mário de Andrade e Oswald de Andrade, que ao futebol dardejaram , de início, crítica e repúdio. Mario de imediato o viu como “uma moda fútil entre tantas que aportam da Europa” em Paulicéia desvairada, “uma praga” em Macunaíma, e não deixou de realçar a violência e o teor elitista do futebol “permeado de expressões estrangeiras” - a la Lima Barreto - em algumas crônicas, “subproduto de importação, a adoção de mais um artigo de luxo , com sua linguagem integralmente inglesa e seu vestuário britânico desconhecido , provindo de uma matriz européia transplantada por uma elite anglófila e francófila, ávida por novidades e exotismos, típico da dependência cultural brasileira” ; porém, em 1939 acentuava a transformação verificada em torno do futebol, o processo de apropriação pela identidade da nação chegando a adquirir um caráter antropofágico onde se afirmava “a capacidade brasileira de deglutição, bem como de assimilação das influências estrangeiras e de sua transformação em expressões genuinamente nacionais”. Oswald de Andrade, por sua vez, referiu-se com uma certa simpatia --mais irônica -- nos versos de “E a Europa curvou-se ante o Brasil”, de 1925, e em “Bungalow das rosas e dos pontapés”, sarcástico poema sobre a violência do futebol ; embora sempre combatesse o futebol, como veículo de “alienação”, mais tarde iria referir-se, num artigo de jornal, como “um fenômeno da modernidade de fundamento religioso, ao lado dos festivais de cinema e da política” ; e ligou-se a Mario Filho e a Candido Portinari justamente por causa do futebol...Relevante observar especificamente o ‘relacionamento’ dos intelectuais modernistas com o futebol, recebido de modo diametralmente oposto na primeira, na segunda e na terceira fase (assim Afrânio Coutinho caracteriza o ciclo modernista): o fenômeno futebolístico no Brasil dos anos de 1920 passando muito ao largo das preocupações missionárias dos primeiros, depois, já na década de 1930, o futebol interpretado sob a questão da representatividade nacional , uma forma de se chegar às suas concepções sobre a brasilidade; e no decênio seguinte, entrando em cena os regionalistas oriundos do Nordeste —Gilberto Freyre, José Lins do Rego, Rachel de Queiroz, Jorge de Lima, Olívio Montenegro, a maioria já radicada no Rio de Janeiro — a interpretação modernista colocando o futebol também no terreno da cultura popular, retomando o projeto de construção de símbolos nacionais,que a música popular e o folclore já haviam tornado possíveis e que, naquele momento, por meio de uma ‘brasilidade esportiva’, o futebol também facultava.

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