segunda-feira, 31 de dezembro de 2007

a síndrome de Próspero


mais do que necessária reflexão para o fim deste 2007 e lumiar de 2008, vale observar o quanto de relevante , para uma vida (de cada um ) que se pretenda cultural-- isto é regida pela proeminência da saúde intelectua -- é o que denomino 'síndrome de Próspero'.

a referência é à peça de Shakespeare, A tempestade, representada em 1 novembro de 1611, diante do rei Jaime I, na Inglaterra: o ponto central do drama é a cena em que Próspero,duque de Milão, prefere a companhia dos livros ao invés e em vez de se dedicar à prática do governo, permanecendo muito mais tempo no estudo e na leitura do que nos deveres de Estado-- "para mim, pobre homem,minha biblioteca é um ducado bastante grande"(ato I,cena 2, versos 109-10). numa das mais densas tramas (entre tantas) do bardo mestre -- ícone máximo da cultura ocidental, síntese humana de todo saber-- a atitude de Próspero gera desordens políticas, a ponto de Antonio, seu irmão, tomar-lhe o governo e destruir a cidade; ante a usurpação humana, a natureza se revolta e produz a tempestade. Próspero, dotado de alto poder intelectual e espiritual,provido pelo saber, confinado a um reino distante e exilado em ilha desconhecida, tem os livros por toda parte, à sua volta -- mas cumprindo um papel paradoxal: na mesma medida em que dão força a quem os possui,podem fazer perder um trono, quiçá a própria cabeça, a própria vida. O terrível,catastrófico dilema shakespeariano : a restauração do poder pede a renúncia aos livros,ou seja somente com a abdicação do saber atinge-se e detém-se o poder.

Questione-se esse dilema, por favor. Refute-o sob todas as formas. Não abra mão de sua intelectualidade em prol de benefícios ou confortos materiais, não privilegie a abastança financeira p. ex. em detrimento da riqueza cultural. Não destitua o conhecimento, a sabedoria,o embasamento, para dar lugar a vãs ,inócuas e irrisórias 'conquistas' mundanas.

Não se deixe confinar num 'reino distante,desconhecido, inóspito', e preserve o Próspero que tem de existir dentro de cada um.

Nenhum comentário: